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Expectativa com células-tronco gera superoferta de cobaias para estudos

O comerciante José Roberto, de Santa Cruz do Capibaribe (PE), ficou paraplégico após um tiro. Marcia, de Curitiba, tem um filho com diabetes tipo 1. Ricardo, 23, de Salvador, é portador de insuficiência renal crônica. Fernando, 16, de São Paulo, tem uma doença neurodegenerativa que o deixou cego e agora compromete a fala. Assim como essas pessoas, outras milhares procuram -por e-mail, carta e telefone- os centros especializados em terapia celular ligados às universidades públicas oferecendo elas próprias ou parentes como “cobaias” humanas em pesquisas com células-tronco (CTs) embrionárias, recém-aprovadas pela Lei de Biossegurança.

Um médico da USP de Ribeirão Preto (SP) recebeu 7.000 e-mails nos últimos dois meses. No Hospital das Clínicas de Ribeirão e de São Paulo, são quase 400 mensagens por dia, de todo o país. Mas o uso terapêutico das células-tronco embrionárias está longe de ser realidade, no Brasil e no resto do mundo. Não há previsão de quando vão se iniciar as pesquisas clínicas nem quais as doenças potencialmente tratáveis.

Os estudos e os tratamentos experimentais com células-tronco da medula óssea ou do cordão umbilical estão mais avançados, com cirurgias bem-sucedidas em cardiologia e neurologia. “Gerou-se uma expectativa enorme. Pessoas que já não tinham esperança estão vendo uma luz no fim do túnel. Mas não podemos dizer que há tratamento. Não podemos criar falsas ilusões”, afirma Dimas Tadeu Covas, professor da Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão.

Hoje há ao menos cinco grupos trabalhando com CTs embrionárias de camundongos e estariam, em tese, habilitados a trabalhar com as humanas após a sanção da lei pelo presidente Lula. Porém, não há previsão de pesquisas clínicas nos próximos cinco anos.

Para Lygia da Veiga Pereira, chefe do Laboratório de Genética Molecular do Departamento de Biologia da USP de São Paulo, há ainda muito o que aprender com as CTs antes de serem usadas como tratamento de doenças. Uma das preocupações é com a segurança dessa terapia. Nas pesquisas experimentais com camundongos, os cientistas já perceberam que, quando injetadas em seu estado nativo, as CTs embrionárias podem se multiplicar e se diferenciar descontroladamente, formando tumores. “Antes de injetarmos essas células no paciente, temos que induzi-las no laboratório a se transformar no tipo celular que nos interessa”, explica Pereira.

Outra questão diz respeito à compatibilidade entre as CTs embrionárias e o paciente. Em todo transplante é necessário existir uma compatibilidade entre doador e receptor para que o órgão não seja rejeitado. O mesmo deve acontecer com um transplante de CTs embrionárias. “Uma alternativa seria então criar CTs embrionárias ”sob medida“, ou seja, geneticamente idênticas ao paciente. Com as técnicas de clonagem, podemos criar um embrião clonado do paciente e dele extrair as CTs embrionárias. Poderiam gerar tecidos 100% compatíveis”, afirma Pereira. A técnica se chama clonagem terapêutica, mas foi vetada pela Lei de Biossegurança.

Mesmo que fosse permitida, a clonagem terapêutica não poderia ser utilizada em indivíduos com doenças genéticas porque as CTs embrionárias geradas a partir das células desses pacientes também carregariam a doença e, por isso, não seriam capazes de gerar tecidos sadios para transplante. “A melhor alternativa para esses casos é ainda conseguir um doador aparentado, que tem maior chance de ser compatível.”

Fonte: Folha de São Paulo